Isolamento social faz ratos saírem de esconderijos em busca de alimento durante o dia

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Um rato saindo de um bueiro na cidade de Nova York. Com mais cidades impondo o isolamento como medida para frear a pandemia da covid-19, os ratos se tornam mais ousados na busca por comida. Foto de Charlie Hamilton James, Nat Geo Image Collection

CONFORME AS PESSOAS em todo o mundo alteram seu comportamento diário para tentar retardar a disseminação do novo coronavírus, a ausência humana está causando efeitos colaterais no ecossistema urbano. Entre as mudanças mais visíveis: os ratos estão saindo de seus esconderijos. Eles estão saindo às ruas em plena luz do dia e invadindo casas em uma busca desesperada por comida.

No famoso French Quarter de Nova Orleans, Estados Unidos, não há mais turistas — nem o lixo deixado por eles. De repente, ratos famintos se aventuram aos montes durante o dia. Em Seattle, ratos foram vistos travando disputas em parques públicos, no meio da tarde. “Eles não estavam preocupados em fugir, correr ou se esconder”, escreve Charles Mudede, do The Stranger. “Em vez disso, se empolgaram com as aparas de madeira e pareciam alunos se apresentando em um musical escolar.”

Pessoas que nunca tiveram problemas com ratos anteriormente estão precisando lidar com visitantes indesejados que agora invadem seu isolamento social. Annette e Andreas Spreer armazenam tubérculos, repolhos e maçãs em seu porão desde 1995. Eles moram em Stuttgart, na Alemanha, onde os restaurantes estão fechados desde 22 de março e as pessoas ficam em casa a maior parte do tempo. Alguns dias atrás, pela primeira vez, ela notou que algumas de suas batatas pareciam ter sido roídas. “Eles não comeram a maçã, o repolho ou as cenouras. Apenas as batatas”, comenta Annette. “Eu nunca iria imaginar que isso pudesse acontecer.”

Histórias como essa provavelmente estão acontecendo em todo o mundo, de acordo com Robert Corrigan, especialista em roedores urbanos que atua como consultor independente, oferecendo seu conhecimento a cidades em todos os continentes. Ele diz que, conforme determinadas colônias de ratos perdem suas fontes garantidas de alimentos — como resíduos jogados no chão e lixeiras em parques ou lixeiras do lado de fora de restaurantes — começa uma briga por qualquer resto de alimento. Alguns ratos podem até matar e comer sua própria espécie para sobreviver. (Corrigan diz que os ratos do parque de Seattle provavelmente estavam “brigando com a intenção de matar”.) Outros exploram o desconhecido, procurando novas fontes de alimento.

Ratos atacam uma lata de lixo na baixa Manhattan antes da pandemia de coronavírus. Normalmente, os ...
Ratos atacam uma lata de lixo na baixa Manhattan antes da pandemia de coronavírus. Normalmente, os nova-iorquinos que moram em ambos os lados da cidade jogam lixo suficiente nas ruas para que os ratos possam viver suas vidas a menos de 45 metros de onde nasceram, mas agora é provável que mais roedores invadam as casas para encontrar sua próxima refeição.
Foto de Charlie Hamilton James, Nat Geo Image Collection

Em casa para o jantar

Se ratos famintos conseguirem farejar alimentos em sua casa, há grandes chances de eles tentarem entrar. “Eles vão se guiar pelo faro e passar embaixo da porta se conseguirem”, diz Corrigan.

Uma vez no interior da residência, os ratos farão o que for preciso para encontrar comida e sobreviver. “Trata-se de um animal selvagem que vai procurar comida pela casa”, afirma Corrigan. “Se houver um bebê em um berço com uma mamadeira, eles tentarão encontrar a fonte desse odor. Eles podem mastigar fios e trazer seus próprios vírus. Ratos em casa são assunto sério.”

Os próprios ratos podem transmitir doenças. Não há evidências de que eles possam ser infectados com o SARS-CoV-2, o vírus que causa a covid-19. Mas Corrigan acredita que eles possam movimentar o vírus quando andam por canos de esgoto cheios de fezes e depois entram nas casas das pessoas. “Se conseguimos transmitir o vírus ao carregá-lo na ponta de nossos dedos, é claro que os ratos conseguem transmiti-lo por meio de suas patas, pelo e caudas”, diz Corrigan.

Mesmo que ratos de esgoto tragam fezes humanas para sua casa, você não deve entrar em pânico. Embora o vírus tenha sido encontrado nas fezes de pacientes infectados hospitalizados, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos diz que o risco de transmissão a partir das fezes é baixo.

Higiene doméstica

De qualquer forma, agora pode ser um bom momento para melhorar a higiene da sua casa, assim como muitos de nós intensificamos a lavagem das mãos. Lixeiras externas devem possuir tampas seguras e bem ajustadas. Rachaduras sob portas e outras aberturas para o exterior da residência devem ser vedadas. Os ratos podem se espremer sob uma porta que está a apenas 1,2 centímetro do chão e fugir sob uma fenda de 60 centímetros de altura, diz Corrigan.

Se ratos ou camundongos estão circulando em sua casa, a boa notícia é que o controle de pragas é considerado um “serviço essencial” que segue em funcionamento, de acordo com Jim Fredericks,  entomologista-chefe da Associação Nacional de Controle de Pragas. “As pessoas acham que o controle de pragas é um luxo ou que as pragas são apenas um incômodo, mas existem muitas pragas que ameaçam a saúde pública, nosso estoque de alimentos [e] nossas propriedades”, afirma Fredericks.

Ratos emergem de um vão na calçada da Pearl Street, na cidade de Nova York.
Ratos emergem de um vão na calçada da Pearl Street, na cidade de Nova York.
Foto de Charlie Hamilton James, Nat Geo Image Collection

O risco apresentado pelos roedores é alto o suficiente, portanto, vale a pena permitir o acesso de um especialista em controle de pragas à sua casa, se necessário, segundo ele. Ao ligar para marcar uma visita, Fredericks recomenda perguntar à empresa sobre as medidas que serão tomadas para minimizar o risco de propagação do coronavírus pelo técnico. “As empresas de controle de pragas estão se adaptando a essa nova realidade”, afirma Fredericks. “Recebemos relatos de membros que estão fornecendo treinamento adicional para que os funcionários mantenham distâncias seguras, bem como higienizem e lavem as mãos.”

Fredericks acrescenta que, se os roedores estão famintos o suficiente para explorarem novos lugares em busca de comida, provavelmente também estão com fome o suficiente para cair em armadilhas. (Lembre-se de que alguns métodos para eliminar ratos causam mais sofrimento que outros: armadilhas com veneno e cola matam de forma lenta e dolorosa, ao passo que boas armadilhas instantâneas matam o animal na hora. Há também a opção de armadilhas vivas, nas quais os roedores são posteriormente soltos em um campo ou na mata.)

Diferentes ratos ocupam diferentes nichos ecológicos na cidade. Os ratos do parque provavelmente serão os mais afetados, pois as lixeiras ficam vazias e os piqueniques cessam. Esses ratos, forçados a procurar alimento a céu aberto, podem se tornar presas fáceis de gaviões, corujas, coiotes e guaxinins.

Pelo menos em curto prazo, enquanto nós, humanos, permanecermos em casa, esses predadores podem ser os reis da selva urbana, ficando cada vez mais gordinhos e felizes nas ruas tranquilas.

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