Hemoparasitoses: Desvendando os Diferentes Agentes da Doença do Carrapato

6 min. leitura
doenca carrapato - Pragas e Eventos
Foto: Divulgação - Portal Em Tempo

Diagnóstico preciso é fundamental para tratamento eficaz das múltiplas doenças transmitidas por carrapatos

A identificação correta dos agentes causadores das hemoparasitoses representa um dos maiores desafios enfrentados pelos médicos-veterinários na prática clínica. Conhecida popularmente como “doença do carrapato”, essa condição engloba na verdade um complexo grupo de enfermidades causadas por diferentes patógenos transmitidos por esses ectoparasitas.

Diversidade de Agentes Patogênicos

Segundo a médica-veterinária Simone Gonçalves Rodrigues Gomes, doutora pela Universidade de São Paulo (USP) e gerente técnica do Petcare Hemovet, existe uma ampla variedade de protozoários e bactérias responsáveis pelas hemoparasitoses. Os principais agentes etiológicos incluem Ehrlichia canis, Babesia vogeli, Anaplasma platys, Rangelia vitalli, Rickettsia rickettsii, Hepatozoon canis e Mycoplasma haemocanis.

Embora o termo “doença do carrapato” seja amplamente utilizado de forma genérica, cada patógeno específico resulta em uma condição com nomenclatura técnica própria. Assim, temos a babesiose, erlichiose, rangeliose e anaplasmose, cada uma com suas particularidades clínicas e terapêuticas.

Manifestações Clínicas Variáveis

Todos esses agentes podem provocar manifestações clínicas significativas nos animais, sendo que a gravidade dos sintomas varia conforme a competência imunológica de cada cão. A erlichiose crônica destaca-se como a mais comum, podendo causar lesões em múltiplos órgãos, incluindo os rins por deposição de imunocomplexos.

“A erliquiose crônica é a mais comum, podendo ocasionar lesões em múltiplos órgãos, inclusive nos rins por deposição de imunocomplexos. Nela não há cura parasitológica, apenas controle clínico da doença. Ou seja, uma vez que o cão for infectado ele pode se tornar portador”, explica a especialista.

Em contraste, a rangeliose normalmente desencadeia um quadro clínico grave com risco de óbito, exigindo intervenção veterinária imediata.

Sintomas Comuns e Específicos

As manifestações clínicas dos animais com hemoparasitoses podem ser similares independentemente do agente etiológico. Os sintomas mais frequentes incluem febre, prostração e apatia, porém cada doença apresenta características específicas.

Erlichiose

Na erlichiose, as manifestações variam conforme a fase clínica. Durante a fase aguda, que surge entre 15 a 20 dias após a inoculação pelo carrapato, observam-se febre, hiporexia, prostração, leucocitose ou leucopenia, trombocitopenia, anemia, esplenomegalia e hiperplasia de linfonodos.

Na fase crônica, que pode se manifestar meses ou anos após a infecção inicial, podem ocorrer hiperglobulinemia, uveíte, glomerulopatia, petéquias, sufusões e hipoplasia e/ou aplasia medular. Existe ainda a fase assintomática, onde a Ehrlichia canis permanece no baço ou medula óssea sem causar sinais clínicos evidentes.

Babesiose

A babesiose também apresenta fases aguda, crônica e assintomática. A Babesia vogeli é um protozoário intracelular de hemácias com baixa patogenicidade. Na fase aguda, pode causar febre, anemia hemolítica, trombocitopenia e prostração, enquanto na fase crônica observam-se apenas anemia e trombocitopenia leves.

Anaplasmose

A anaplasmose geralmente causa sintomas brandos, com alguns animais permanecendo assintomáticos. Os cães podem apresentar febre, apatia, trombocitopenia e anemia leve. As manifestações clínicas tendem a ser mais graves quando há coinfecção com outros agentes como Ehrlichia canis e Babesia vogeli.

Diagnóstico Laboratorial Essencial

A única forma de identificar com precisão o agente etiológico causador da hemoparasitose é através de exames laboratoriais específicos. Os exames mais indicados envolvem a associação de testes sorológicos com moleculares, como a PCR (Reação em Cadeia da Polimerase).

O hemograma, embora importante, apresenta alterações similares para todos os agentes etiológicos, não sendo conclusivo para o diagnóstico diferencial. O esfregaço sanguíneo pode eventualmente detectar os patógenos, mas a confirmação através da PCR é sempre recomendada.

Considerações Epidemiológicas Regionais

Quando não é possível testar o animal para todos os agentes etiológicos, deve-se considerar a epidemiologia regional. Em algumas regiões do Brasil há maior prevalência de erlichiose e babesiose, enquanto no sul do país observa-se maior ocorrência de Rangelia e Anaplasma platys.

É importante ressaltar que um mesmo carrapato pode estar infectado com múltiplos agentes etiológicos, tornando possível a coinfecção. Painéis de investigação negativos não garantem que o animal não tenha hemoparasitose.

Prevenção e Controle

A prevenção das hemoparasitoses deve combinar o uso regular de produtos antiparasitários tópicos e/ou orais com o controle ambiental dos vetores. Esta abordagem integrada é fundamental para reduzir o risco de infecção.

O controle efetivo de carrapatos no ambiente requer estratégias profissionais de manejo integrado de pragas, combinando métodos químicos, biológicos e físicos. Empresas especializadas em controle de pragas desempenham papel crucial na implementação dessas estratégias, especialmente em áreas com alta infestação de carrapatos.

Tratamento Específico por Agente

O tratamento varia conforme o agente etiológico identificado. Para erlichiose canina, anaplasmose e micoplasmose, o medicamento de escolha é a Doxiciclina. Já para enfermidades causadas por protozoários, como Babesia vogeli e Rangelia vitalli, indica-se o Dipropionato de Imidocarb.

O diagnóstico preciso é fundamental para o sucesso terapêutico, evitando tratamentos inadequados e possíveis resistências medicamentosas. A identificação correta do agente causador permite ao veterinário estabelecer o protocolo terapêutico mais eficaz e o prognóstico adequado para cada caso.

A conscientização sobre a complexidade das hemoparasitoses e a importância do diagnóstico diferencial contribui para melhores resultados clínicos e bem-estar animal, destacando a necessidade de investimento em métodos diagnósticos avançados e controle preventivo eficaz dos vetores.

Compartilhar