De acordo com o Instituto de Pesquisa Médica do Quénia, Kemri, e os seus associados, a descoberta abre a porta ao desenvolvimento de uma nova classe de medicamentos em menos de dois anos.
Um cenário animador, numa altura em que a comunidade médica internacional aponta para a diminuição da eficácia dos atuais medicamentos contra malária, devido à adaptação do parasita plasmodium falciparum, transportado por mosquitos fêmea, e responsável pela malária.
“A resistência é sempre um problema e o parasita encontra sempre uma forma de se safar. É por isso que uma nova linha de tratamento é imperativa. Tem de estar disponível em breve”, afirmou o Dr Simon Kariuki, diretor dos programas de pesquisa em Kemri, citado pelo jornal britânico The Guardian.
O novo tratamento tem por base o medicamento Ivermectin, baseado em ivermectinas, compostos antiparasitas de largo espectro. É habitualmente utilizado no tratamento da cegueira dos rios e da elefantíase e eficaz também contra ácaros, piolhos e carraças.As ivermectinas têm origem na Streptomyces avermitilis, uma bactéria do género streptomyces.
Testes no Burkina Faso provaram uma relação direta entre a administração do Ivermectin e a diminuição significativa das taxas de transmissão do plasmodium falciparum.
Aparentemente, o sangue das pessoas vacinadas múltiplas vezes com o Ivermectin, torna-se letal para os mosquitos. O estudo demonstrou igualmente que o medicamento, quando administrado em seres humanos, mata o parasita.
Esperança
Um estudo, publicado pela Escola de Saúde Pública da Universidade de Yale, calcula que a administração do Ivermectin em populações de áreas de alto risco, poderá diminuir até 20 por cento os episódios de malária em crianças.
A investigação está a ser realizada no Quénia, por cientistas locais, com o apoio de especialistas internacionais.
O centro norte-americano para o controlo e prevenção de doenças vai agora iniciar testes em humanos, usando nos medicamentos derivados das ivermectinas, após pesquisas laboratoriais intensas.
“Descobrimos que a bactéria é extremamente eficaz a matar o plasmodium falciparum, o parasita que causa a malária”, disse Kariuki. “A nossa pesquisa é mais focada em mulheres grávidas e em crianças, que são mais vulneráveis. Estamos a encontrar dados muito promissores”, referiu ainda.
A iniciativa foi instigada pelos relatórios da Organização Mundial de Saúde e outras agências internacionais, que têm alertado para crescente resistência do parasita da malária aos medicamentos tradicionais.Resistência do parasita
Um dos grandes problemas é a venda dos medicamentos sem receita médica ou a sua toma excessiva.
O Ministério da Saúde do Quénia afirma que os casos de malária aumentaram de 16 mil em 2016 para quase 18.800 no ano passado, e os especialistas dizem que as alterações climáticas vão piorar a situação.
“Estão a ser planeados futuros testes em mulheres e crianças, obviamente com as mais rigorosas garantias de segurança. Necessitamos de mais respostas sobre o Ivermectin. Necessitamos de novos medicamentos contra a malária o mais depressa possível, já que a resistência aos tratamentos não é algo a ser ignorado e temos de encarar a situação como urgente”, considerou Kariuki.
O Dr Evans Murage, um farmacêutico baseado em Nairobi, no Quénia, lembra que “tem havido relatórios confirmados da OMS que se registaram casos de resistência na Tailândia e no Cambodja, e mais perto daqui, na República Democrática do Congo“.
“Há casos de medicamentos vendidos sem receita, o que leva ao aumento da resistência e ao uso excessivo. Muitas pessoas que compram os medicamentos em farmácias suspeitam que têm malária mesmo sem terem sido testadas. Isto deveria preocupar o Governo”, acrescenta.Mais pesquisas
Atualmente, a vacina mais eficaz no efeito protetor contra a malária é a RTS,S. Foi utilizada pela OMS num estudo piloto em 2019. Em testes mostrou-se capaz de prevenir praticamente 39 por cento de casos de malária, em crianças entre os cinco e 17 meses.
“A avaliar pelas atuais pesquisas, dentro de alguns anos será possível ter no mercado novas drogas contra a malária. A mesma bactéria, conhecida por matar perigosos patogénos da sarna ou da cegueira do rio, pode ser também aplicada na malária”, explicou o Dr Kariuki ao The Guardian.
“O sucesso com o Ivermectin está a levar-nos a considerar a produção de outros medicamentos. É muito encorajante e implica mais pesquisa e isso é o que estamos a fazer”, conclui.
A malária afeta mais de 200 milhões de pessoas em todo o mundo e é responsável por quase 500 mil mortes todos os anos, sendo as crianças especialmente vulneráveis. Tem estado em crescimento acentuado no sudoeste asiático.
As ivermectinas foram descobertas em 1975 e começaram a ter aplicação na medicina em 1981. O seu uso é, até agora e divido a pouca investigação, contraindicado em crianças menores de cinco anos ou aquelas que pesam menos de 15 quilos, assim como em mulheres que estejam a amamentar ou em indivíduos com doenças do fígado ou dos rins.