Um problema recente tem chamado atenção de alguns dos maiores centros urbanos no Brasil: escorpiões. A infestação tem atingido principalmente os estados de São Paulo e Minas Gerais, forçando o Ministério da Saúde a criar uma força-tarefa para combatê-los.
Segundo série histórica do Ministério da Saúde feita a pedido da BBC News Brasil, o número de picadas passou de 52.509 em 2010 para 124.903 no ano passado – um salto de 138% nos registros. Se considerarmos as mortes, o aumento no período foi de 152%, saindo de 74 em 2010 para 184 em 2017.
O Ministério da Saúde de fato reconheceu o problema, afirmando que desde 2009 vem fazendo campanhas educativas com profissionais da saúde para alertar sobre os aracnídeos. Mas, devido ao crescimento acelerado do problema, precisou unir forças com o Instituto Butantan – fabricante do soro antiescorpiônico – para elaborar novos projetos de educação e assistência.
O que causa estranhamento é que os escorpiões não são seres exatamente conhecidos por habitar cidades, de modo que eram mais comuns em áreas rurais.
A médica Fan Hui Wen, gestora de projetos do Núcleo Estratégico de Venenos e Antivenenos do Butantan, é uma das responsáveis pelo material que está sendo elaborado e será distribuído aos Estados a partir de 2019.
De acordo com ela, o objetivo é orientar os profissionais de saúde a não negligenciarem possíveis casos de envenenamento e que requeiram o uso imediato do soro. Também serão oferecidas vídeo-aulas para técnicos e agentes responsáveis pela vigilância em saúde.
“Até agora, estamos enxugando gelo no combate aos acidentes com escorpião. Os casos estão aumentando e precisamos encontrar uma resposta para a população. Essa parceria vai permitir fornecermos educação e treinamento à distância para todo o País”
Afirma Wen
Pesquisa para entender o comportamento da espécie
E não é apenas o Ministério da Saúde que está buscando formas de controlar a infestação de escorpiões. O Butantan também firmou uma parceria com a Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) para iniciar uma pesquisa inédita que vai mapear a evolução dos casos e buscar entender o comportamento da espécie – no caso, o Tityus serrulatus, o escorpião amarelo, o mais comum na região Sudeste.
Segundo Wen, no começo dos anos 2000, os casos ficavam restritos à região de Ribeirão Preto. Hoje, já há casos em todo o Estado de São Paulo, e também na região Sul do País.
“Precisamos entender como o escorpião se comporta, como ele se desloca. Ele não anda quilômetros, ele é levado de um lugar para o outro. Hoje em dia já nem conseguimos dizer mais qual é o seu habitat natural, de tão bem que ele se adaptou às áreas urbanas”, diz a médica.
O professor Francisco Chiaravalotti Neto, do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP, será um dos coordenadores do projeto. Ele explicou que o mapeamento das ocorrências será feito por meio das notificações de caso, sem coleta in loco dos animais.
Dessa forma, explica o professor, será possível pensar novas estratégias de saúde pública e redefinir critérios de distribuição do soro antiescorpiônico, por exemplo.
“Hoje, a logística de entrega do soro é baseada nos casos de picadas de cobra. Mas já sabemos que os escorpiões estão mais perigosos que as cobras. Essa pesquisa nos dará um norte e, talvez, a estratégia de entrega do soro mude”, afirmou o professor.
Buscar foco de escorpião como se busca o de dengue
A médica Fan Wen, do Butantan, espera que os resultados da pesquisa tragam respostas à população e, mais do que isso, novas estratégias de combate às picadas.
Na opinião dela, é preciso que as vigilâncias sanitárias das cidades alterem sua rotina de fiscalização e incluam o escorpião nas buscas, assim como acontece com a dengue.
“O agente de saúde vai de casa em casa buscando focos de dengue para evitar casos, certo? Não dá mais para trabalharmos de forma isolada. Os municípios precisam incluir a busca de focos de escorpiões na rotina e fazer com que os agentes procurem o escorpião além do mosquito da dengue”, avalia.