Há 500 milhões de anos, os continentes eram bem menos agitados do que hoje. Até então, toda forma de vida que existia em terra eram as plantas, enquanto a vida animal permanecia no mesmo lugar onde havia surgido: nos oceanos.
Adaptados para viver dentro da água, os animais da época não sobreviviam em terra firme. Mas, em algum momento da história evolutiva, alguma criatura se aventurou em uma jornada em solo firme, provavelmente equipada de adaptações específicas para isso. Agora, cientistas acreditam ter encontrado uma pista sobre essa espécie pioneira: um fóssil de escorpião com mais de 430 milhões de anos, contendo indícios de conseguir respirar oxigênio — o que o torna o provável primeiro animal a habitar o solo.
Com apenas 2,5 cm de comprimento, o fóssil é o mais antigo já encontrado de um escorpião (e também de qualquer outro aracnídeo). Apesar da descoberta recente, publicada na revista Science Advances, o exemplar foi encontrado 35 anos atrás, em uma escavação no estado de Wisconsin, nos EUA. Ele estava preservado em um museu, e não havia sido estudado até então.
A análise revelou que o Parioscorpio venator, como o animal foi nomeado, possuía uma estrutura corporal semelhante a dos escorpiões modernos, incluindo duas garras e uma cauda equipada de ferrão, o que o classifica como um aracnídeo ancestral.
A semelhança mais reveladora, no entanto, foi a da anatomia interna do animal: os sistemas respiratório e circulatório do escorpião ancestral são bem similares as dos escorpiões atuais (veja imagem abaixo), e atuam de maneira parecida com os sistemas dos chamados caranguejos-ferradura modernos, que vivem a maior parte do tempo em águas rasas, mas podem passar períodos na terra respirando ar.
O fóssil foi encontrado em um local de águas rasas, o que indica que o extinto escorpião também vivia tanto no ambiente aquático como no terrestre. Isso o torna o animal conhecido mais antigo com a capacidade de respirar e viver em terra firme. Veja também
Morador antigo
Os cientistas já sabiam que os escorpiões estavam entre os primeiros animais a ocupar a terra firme, provavelmente do período Siluriano da era Paleozóica (entre 443 milhões e 416 milhões de anos atrás). Mas a nova descoberta oferece novos detalhes sobre como a ocupação terrestre ocorreu e sobre quais adaptações corporais estiveram envolvidas – além da datação precisa mais antiga já registrada. O recordista até então era um outro fóssil de escorpião, encontrado na Escócia, entre um e três milhões de ano mais novo que o exemplar recém-identificado.
A ciência se esforça para descobrir qual animal fez a transição da água para a terra, e alguns outros animais, como as centopéias, estão entre os candidatos. Mas a datação precisa do fóssil do escorpião (e sua estrutura interna bem definida) lhe dão uma vantagem nessa competição, mesmo que não tenham sido encontrados pulmões nele.
“[O fóssil] fornece um modelo para outros tipos de animais que fizeram essa transição da água para a terra, incluindo, potencialmente, animais vertebrados. É uma descoberta bombástica”, diz Loren Babcock, geólogo da Universidade Estadual de Ohio e um dos autores do estudo.