RIO – A leishmaniose visceral, doença que causou a morte de uma criança de 3 anos, no último domingo, no Morro Camarista Méier, no Engenho de Dentro, na Zona Norte do Rio, vem se espalhando pelas áreas urbanas do país, e a situação no estado do Rio não é diferente. Entre 1990 e 2017, o número de casos aumentou de dois para 12 ao ano, seis vezes maior. Nesta terça-feira, equipes da prefeitura estiveram na comunidade em que a família do menino Ângelo Miguel de Oliveira Monteiro de Matos mora para capturar mosquitos transmissores da doença. Pesquisadores vão investigar se eles estão contaminados com o protozoário Leishmania chagasi, transmitido ao homem por meio da picada do inseto.
– A análise do liquor da medula da criança foi realizada pelo Instituto Nacional de Infectologia, da Fiocruz, e confirmou a doença. Agora, a Secretaria municipal de Saúde está trabalhando no local em que o menino morava para investigar se a transmissão ocorreu ali, ou seja, se é um caso autóctone – explica a pesquisadora do Instituto Oswaldo Cruz Elizabeth Rangel, coordenadora da Rede de Referência em Leishmaniose da Fiocruz.
Apesar de já estar causando preocupação em estados como São Paulo e Minas Gerais, os casos de leishmaniose visceral não são comuns no município do Rio, segundo os dados epidemiológicos. Em 18 anos, desde que a doença passou a ser monitorado, 47 pessoas contraíram esse tipo de leishmaniose na cidade.
A leishmaniose visceral é a mais grave forma clínica entre as leishmanioses e, na América do Sul, o cachorro apresenta-se como a principal fonte de infecção em um ciclo que envolve animais e o homem. A doença é transmitida por meio da picada de insetos conhecidos popularmente como mosquito palha, asa-dura, tatuquiras e birigui. As fêmeas infectadas picam cães ou outros animais infectados, e depois picam o homem, transmitindo o protozoário Leishmania chagasi. Os cachorros não transmitem a doença para o homem, são apenas reservatórios do parasita.
De acordo com a Secretaria municipal de Saúde, nesta terça-feira, durante a vistoria no Morro Camarista Méier, os agentes coletaram sangue de cachorros da região e eliminaram possíveis focos de mosquitos transmissores da doença, que costumam proliferar em locais com lixo e em criadouros de animais.
O enterro do menino Ângelo Miguel será nesta quarta-feira, às 16h, no Cemitério São Francisco Xavier, no Caju.
Caju e Zona Oeste do Rio são áreas endêmicas
Segundo Elizabeth Rangel, o Brasil está enfrentando um processo de expansão territorial da leishmaniose visceral, com a doença se alastrando para o Sul:
– Temos a doença em capitais e cidades de grande porte. Precisamos monitorar o vetor (mosquito palha), fazer o controle de animais (cachorros são reservatórios do protozoário) e capacitar profissionais de saúde para diagnosticar a doença.
A migração da doença de áreas rurais para urbanas teve início na década de 1980. No ano de 2011, um número alto de casos de leishmaniose visceral canina chamou a atenção das autoridades sanitárias na região central da cidade do Rio.
– No bairro do Caju, foi registrada a primeira situação de urbanização da doença no estado. E, um ano depois, foi registrado um caso humano – diz a pesquisadora.
Além do Caju, o município do Rio também apresenta áreas endêmicas para a leishmaniose visceral (onde a transmissão é constante) na Zona Oeste, como os bairros de Campo Grande, Realengo, Bangu e Senador Camará.
Em humanos, a leishmaniose visceral causa febre de longa duração, aumento do fígado e baço, perda de peso, fraqueza, redução da força muscular e anemia. Cães infectados podem permanecer sem apresentar nenhum sinal clínico aparente por meses ou anos. Mas quando a doença se manifesta, podem apresentar: perda de apetite; emagrecimento progressivo; feridas na pele (que demoram a cicatrizar), principalmente no focinho, orelhas, articulações e cauda; pelos opacos, descamação e perda de pelos; crescimento anormal das unhas; diarreia, vômito e sangramento intestinal.
De acordo com o Ministério da Saúde, em média, cerca de 3.500 casos da doença são registrados anualmente no país. Nos últimos anos, a letalidade vem aumentando gradativamente, passando de 3,1%, em 2000, para 7,1%, em 2012.
Medidas de prevenção
É importante evitar a criação e proliferação do inseto vetor da doença, o mosquito palha, que se reproduz no meio de matéria orgânica e em criadouros de animais. Para isso deve-se:- Evitar a criação de porcos e galinhas em área urbana
– Manter a casa e o quintal livres de matéria orgânica, recolhendo folhas e galhos de árvores, fezes de animais, restos de madeira e frutas
– Todo o lixo deve ser embalado e fechado em sacos plásticos
– Os proprietários de terrenos desocupados devem adotar as mesmas medidas descritas acima