Escorpionismo – Um desafio para a Saúde Pública Americanense

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escorpionismo e os desafios da saúde pública

As pragas urbanas assumiram uma proporção geométrica em escala de proliferação em muitas regiões do planeta. Apresentando enormes riscos para a saúde e bem-estar de nossas populações, são causadoras de agravos e doenças com potencial risco de morte, através de interações antagônicas estabelecidas entre várias espécies de artrópodes e o homem.

Dentro dessa relação de um antagonismo sinantrópico, os artrópodes peçonhentos constituíram um papel primordial, com as espécies de escorpiões causando acidentes de importância médica e repercussão epidemiológica crescente. O grave problema do escorpionismo ocasiona nas regiões tropicais e sub-tropicais milhões de acidentes e milhares de mortes, principalmente de crianças.

A responsabilidade pública em seu controle tem sido tratada de forma negligenciada por todas as esferas de governo no Brasil. Houve um aumento de quase 600% no número de acidentes e mortes por escorpiões nos últimos 15 anos, como resultado da expansão urbana sobre áreas antes ocupadas por matas e do acúmulo de lixo e entulho nas cidades. Desde 2011, ocorreram mais de 60.000 casos por ano de acidentes por escorpiões no Brasil, causados por espécies de importância médica, principalmente Tityus serrulatus (BRITES-NETO; BRASIL, 2012).

Dados do Ministério da Saúde relataram a ocorrência de 156.833 acidentes humanos por escorpiões no Brasil, com um coeficiente de incidência de 75 casos/100.000 habitantes e 94 óbitos, no ano de 2018. No ano de 2020, ocorreram 36.109 acidentes no estado de São Paulo, com um coeficiente de incidência de 78 casos/100.000 habitantes e 7 óbitos.

Em 2020, no município de Americana essa grave situação epidemiológica apresentou 444 acidentes por escorpiões e um coeficiente de 183 casos/100.000 habitantes, com óbitos de crianças ocorridos em 2013 (idade de 5 anos) e 2017 (idade de 3 anos).

O escorpião amarelo (T. serrulatus, responsável por acidentes de maior gravidade) e o escorpião marrom (T. bahiensis) são os principais causadores de acidentes de importância médica, no estado de São Paulo (BRITES-NETO; DUARTE, 2015).

Estudos de geoprocessamento em saúde, realizados pelos técnicos do programa em Americana, permitiram o mapeamento de áreas de risco e a delimitação de hotspots em nível de atenção epidemiológica, para o monitoramento de acidentes e estratégias de controle químico no território urbano (ARAÚJO et al., 2016).

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No município de Americana, no período de 1901 a 1912, já havia relato de espécies ainda não identificadas de escorpiões, apresentando forte associação com os processos de armazenamento e transporte dos cultivos agrícolas que propiciavam a proliferação e dispersão dessas infestações no território americanense, onde a ocupação e exploração do hábitat natural pelo homem, evoluía com uma grande negociação de terrenos nas áreas de expansão urbana do município (BRASIL et al., 2013). Somente a partir de 1998, os trabalhos preventivos de acidentes escorpiônicos intensificaram-se, através de medidas educativas junto à população executadas à época pelo Núcleo de Controle de Zoonoses. Em 2005, com a criação do Programa de Vigilância e Controle de Escorpiões (PVCE) foi implantada uma inovação metodológica de controle mecânico de escorpiões, em focos de infestação nos cemitérios, através de um dispositivo de luz ultravioleta para captura noturna de espécimes (BRITES-NETO; GALASSI, 2012). Essa nova ferramenta propiciou um aumento expressivo na coleta de exemplares, estabelecendo recordes biomédicos no estado de São Paulo. Foram capturados de 2005 a 2021, 151.867 espécimes de T. serrulatus e entregues 91.280 escorpiões vivos ao Instituto Butantan e Instituto Vital Brazil, conferindo ao município o status de maior fornecedor de escorpiões vivos para fins de produção de soro antiescorpiônico.

O Instituto Butantan em São Paulo, divulgou recentemente uma tabela com o ranking de cidades paulistas, em relação ao número de escorpiões vivos doados à instituição nos anos 2019/2020, com objetivo de extração de veneno para estudos farmacológicos e produção de soro antiescorpiônico, onde o município de Americana figura com a segunda maior contribuição.

CIDADETOTAL
Itapira26.331
Americana20.117
São José dos Campos10.173
São Paulo9.475
Espírito Santo do Pinhal8.966
Jundiaí6.613
Araraquara4.232
Serra Negra1.913
Mauá1.563
Fonte: Instituto Butantan, 2021.

No mesmo período, o Instituto Vital Brazil de Niterói/RJ informou que somente dois municípios brasileiros suprem com esse material biológico, em contribuição ao trabalho de produção de insumos imunobiológicos por parte do instituto (Valença no estado do Rio de Janeiro e Americana em São Paulo). Durante o transcurso da pandemia somente o município de Americana manteve esse trabalho de fornecimento de escorpiões ao instituto, doando 8.852 escorpiões em 2020 e 2.663 escorpiões em 2021.

Esses resultados de grande expressão numérica, qualificam os trabalhos de uma valorosa equipe de profissionais da área de vigilância em saúde do município de Americana, contribuindo de forma significativa dentro do Sistema Único de Saúde para a produção e distribuição de soro antiescorpiônico, pelos dois institutos de referência, atenuando os riscos de óbitos em crianças de todo o Brasil.

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Dr. José Brites Neto

José Brites Neto

PhD, Médico Veterinário, Secretaria de Saúde de Americana/SP.

Possui Graduação em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (1984); Mestrado em Produção Animal Sustentável pelo Instituto de Zootecnia de Nova Odessa/SP (2011) e Doutorado em Ciências, área de concentração em Microbiologia Agrícola pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – ESALQ (2017).

Atualmente é Médico Veterinário da Secretaria de Saúde, Prefeitura Municipal de Americana/SP. Tem experiência na área de Saúde Pública, com ênfase em Saúde Pública Veterinária, atuando principalmente nos seguintes temas: Controle de Zoonoses, Vigilância Sanitária de Alimentos, Vigilância Epidemiológica (Raiva, Leptospirose e Febre Maculosa Brasileira), Entomologia Médica, Parasitologia Veterinária, Controle e Manejo de Escorpiões, Manejo de Animais Silvestres e Enfermidades de Peixes Neotropicais.

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, M.V., BRITES-NETO, J., NAVEGA-GONÇALVES, M.E.C., 2016. Análise epidemiológica e distribuição espacial e temporal dos acidentes por escorpiões na cidade de Americana, São Paulo, Brasil. Boletim Epidemiológico Paulista. 13(156):1-18.

BRASIL, J., ZUMKELLER, S., BRITES-NETO, J., 2013. Perfil Histórico do Escorpionismo em Americana. Hygeia, Revista Brasileira de Geografia Médica e da Saúde. 9(17):158-167.

BRITES-NETO, J., BRASIL, J., 2012. Estratégias de controle do escorpionismo no município de Americana, SP. Boletim Epidemiológico Paulista, 9(101):4-15.

BRITES-NETO, J., GALASSI, G.G., 2012. Monitoramento epidemiológico de Tityus serrulatus em áreas urbanas, mediante dispositivo de luz ultravioleta. Vetores & Pragas. 30:16-18.

BRITES-NETO, J., DUARTE, K.M.R., 2015. Modeling of spatial distribution for scorpions of medical importance in the São Paulo State, Brazil. Veterinary World. 8(7):823-830. DOI: 10.14202/vetworld.2015.823-830.

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